Por Valmir de Souza
A série As Mães dos Pinguins é mais do que um retrato sensível da maternidade: é um convite à reflexão sobre inclusão, preconceitos e os desafios enfrentados por famílias de crianças com deficiência. A produção acompanha quatro mães cujos filhos possuem diferentes condições, como Transtorno do Espectro Autista (TEA), Síndrome de Down e doenças raras, revelando não apenas as dificuldades do dia a dia, mas também a luta constante por direitos e por uma sociedade mais acolhedora.
O título já carrega uma metáfora poderosa. Os pinguins, apesar de serem aves, não voam, mas encontraram uma maneira única de sobreviver e se adaptar ao ambiente. Essa analogia nos leva a um questionamento essencial: será que nossa sociedade tem se comportado como uma colônia de pinguins, protegendo e acolhendo aqueles que mais precisam?
No Brasil, segundo a Pnad Contínua do IBGE (2022), há cerca de 760 mil crianças de dois a nove anos com algum tipo de deficiência.
Como se pode perceber, nossa população de pequenos pinguins tem uma grande representatividade no país quando tratamos de números, mas não como pessoas. O que vemos é um cenário em que a inclusão ainda se restringe ao discurso.
Acessibilidade não se resume a rampas e banheiros adaptados; trata-se de criar um ambiente onde todas as pessoas possam conviver sem barreiras físicas ou sociais. Na série, fica evidente que o preconceito é um dos principais obstáculos enfrentados por essas mães. Elas precisam lidar com olhares de reprovação, falta de suporte adequado e políticas públicas ineficazes.
O setor privado ainda enxerga a inclusão como um custo, e não como uma oportunidade de atender a um público consumidor que também precisa de produtos e serviços adaptados.
As políticas governamentais tampouco são diferentes. Vide a recente mudança no Benefício de Prestação Continuada (BPC), que demonstrou o retrocesso de uma política pública que já é aplicada de maneira equivocada. O BPC só chegava a alguns poucos grupos, pois a maioria não conseguia cumprir os requisitos.
Até no quesito profissional. Quantas empresas têm a sensibilidade de incorporar uma jornada adequada a uma mãe de um pinguim que permita a ela trabalhar e cuidar desta pessoa, que muitas vezes já é um adulto?
Se queremos ser uma sociedade verdadeiramente inclusiva, precisamos mudar essa mentalidade. É urgente que empresas, escolas e políticas públicas deixem de enxergar essas crianças apenas como estatísticas e passem a reconhecê-las como cidadãos plenos, com direitos e necessidades que vão muito além de adaptações básicas. A acessibilidade deve ser pensada de maneira ampla, envolvendo desde infraestrutura até treinamento e acolhimento humano.

Valmir de Souza é CEO da Biomob, startup especializada em soluções de acessibilidade e consultoria para projetos sociais
SUGESTÕES DE PAUTA: [email protected]