Por Evandro Lopes
Não é de hoje que a pergunta “o que você quer ser quando crescer?” causa desconforto em quem a ouve. Para muitos, ela se tornou sinônimo de angústia, de cobrança precoce e até de frustração. Em tempos em que o mercado se transforma em velocidade vertiginosa e as certezas se dissolvem com a mesma rapidez com que surgem, a busca por uma identidade profissional sólida se revela cada vez mais complexa e, por que não dizer, ilusória. A inquietação não está apenas na pergunta em si, mas no peso que ela carrega. Afinal, como esperar que um jovem, muitas vezes em processo de autoconhecimento, defina sua trajetória futura com segurança, em meio a um cenário de tantas incertezas? A ideia de que é possível, ou desejável, seguir uma única profissão por toda a vida já não se sustenta diante das exigências contemporâneas. A era dos caminhos lineares ficou para trás.
Essa expectativa social imposta precocemente afeta diretamente o bem-estar dos jovens. Ao serem pressionados a fazer escolhas definitivas cada vez mais cedo, muitos acabam associando valor pessoal à carreira, o que intensifica quadros de ansiedade e insegurança. O sistema educacional e o discurso familiar, muitas vezes bem-intencionados, contribuem para esse cenário ao reforçar a necessidade de “decidir o futuro” ainda na adolescência. Em vez de guiar, impõem. Além disso, o próprio conceito de sucesso precisa ser revisto. A lógica tradicional, que ainda vincula realização profissional a status, estabilidade e retorno financeiro, deixa de fora elementos fundamentais como propósito, prazer e saúde mental. O resultado? Gerações que, mesmo após “escolherem” um caminho, se sentem desconectadas dele, vivendo sob o peso de uma escolha que talvez nem tenha sido realmente sua.
É preciso flexibilizar a forma como se enxerga o desenvolvimento profissional. Mais do que encontrar um “rótulo” para definir quem se é, trata-se de compreender que a trajetória pode, e deve, ser construída aos poucos, com espaço para mudança, aprendizado contínuo e, principalmente, acolhimento das dúvidas. Ninguém precisa estar pronto aos 17 anos. E tudo bem se mudar de ideia no meio do caminho. A crítica, no entanto, não se limita à sociedade ou ao mercado: ela alcança também a forma como os próprios jovens se percebem. Ao internalizarem a pressão por uma resposta imediata e definitiva, muitos passam a se cobrar de forma desmedida, esquecendo que a construção da identidade, profissional e pessoal, é, por natureza, um processo.
Então, revisitar a famosa pergunta “o que você quer ser quando crescer?” exige mais do que reformulá-la. Exige ressignificá-la. Em vez de pressionar por uma resposta pronta, talvez seja mais útil perguntar: “o que te interessa agora?” ou “o que te faz curioso?” Assim, em vez de estreitar horizontes, ampliamos possibilidades. É urgente repensar os discursos que moldam nossas expectativas sobre o futuro. Só assim será possível criar um ambiente mais saudável, onde as escolhas possam ser feitas com liberdade, consciência e espaço para transformação. Porque, no fim das contas, crescer não deveria ser sinônimo de se encaixar, mas de se descobrir.

Evandro Lopes é CEO da SLCoom, empreendedor, palestrante e consultor.
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